a mais intensa nos fatos em si foi uma menina que era notoriamente linda. minha mãe vivia dizendo que seria muito bom pra mim se eu namorasse uma gatinha como ela, desde pequeno até o começo da minha juventude, também um ano antes da Primeira Vítima. ela era uma menina meio misteriosa para mim, filha de pessoas influentes na igreja e eventualmente ela mesma se tornou uma influência na igreja, mas essas pessoas todas eram amigas dos meus pais antes mesmo de se tornarem influentes então nos víamos bastante. ela era extrovertida, eloqüente e muito bonita, na infância eu não levava a sério o que minha mãe falava mas na adolescência ficava irritado quando ela vinha com esses assuntos porque, na adolescência, eu era incapaz de acreditar que poderia namorar qualquer pessoa por me ver como um adolescente horrível nerd anti-social desinteressante cheio de espinhas. imagina se uma menina desse nível teria qualquer interesse em mim? eu também estava com a balança pendendo para o ateísmo, quase me afastando da igreja enquanto ela era uma pessoa influente ali, a nossa relação não fazia sentido algum.
confesso que era cego demais para trazer ao leitor um relatório sobre a nossa adolescência, mas na infância tivemos sim alguma proximidade. já fui na casa dela tomar sorvete ao menos uma vez, eu gostava quando eles vinham em casa porque poderia mostrar meus joguinhos embora não saiba dizer se alguém se interessava nisso. no final da adolescência me recordo de termos conversado sobre faculdade, ela querendo fazer arquitetura meio deslumbrada comigo porque eu já tinha entrado na engenharia, como se fosse muito prodigioso entrar um ano mais cedo nas coisas. ela, cada vez mais influente. eu, cada vez mais distante. uma vez vi a família dela todinha sendo honrada num evento especial e me senti muito triste pensando que, enquanto ela e o irmão dela estavam dando orgulho episcopal aos seus pais, eu era um jovem desviado, trancado no meu quarto, que tinha saído no soco com o próprio pai porque não queria ir na igreja e que tinha sido exorcizado por ele. eles queriam a minha amizade, eles queriam que eu estivesse por perto, mas eu estava preso dentro de mim mesmo e se meus pais não eram capazes de me resgatar eles é que não seriam. o irmão dela provavelmente estava dividido entre isso e me achar um mongol, ela era uma menina então não tinha tanto interesse em me achar um mongol.
não muito tempo depois algo grave ocorreu na família deles ao ponto de haver o divórcio e eles, como estavam num nível alto da igreja, tiveram de se afastar completamente. contra a vontade. ninguém ali queria mas não poderiam ser expostos a uma igreja toda sendo a influência que eram. eu sabia da história toda e conheci a família deles muito cedo, já estavam fazendo uns doze anos que nos conhecíamos, o meu coração se entristeceu demais pensando no que aconteceria com eles. os irmãos foram abalados e se perderam por alguns meses mas, talvez pela mãe ser uma mulher muito intensa em seu relacionamento com Deus, logo eles se recompuseram, saíram da pequena londres e foram reconstruir sua vida em outro lugar. na última vez que ouvi notícias ouvi que eles estavam bastante bem, estudando teologia e (boatos apenas) sendo enviados para missões em outros países.
fiquei bastante reconfortado pelo desfecho feliz mas, no final das contas, é uma história triste. é uma história que não precisava ter acontecido. e é uma história que não me lembro muito bem a razão de estar contando, a moça era mesmo muito gatinha mas não creio que minha amizade foi mais especial que qualquer outra na vida dela. quanto a mim, bem, todas as amizades que tive foram especiais, não existe uma que não lembro.
desde que me chame para contá-las em forma de história, é claro.