ufa! desculpem, ouvintes. me perdi completamente na música, mas agora voltarei. comecei esse assunto de dizer que não gostava de nenhuma das meninas para descrever um problema sério, não para falar de sexualidade, e esse problema era: eu fantasiava que gostava das meninas por aqueles motivos que descrevi e fantasiava muito bem. se meu cérebro fosse constituído de válvulas eu diria que quando “gostava” de uma menina nessa época ele fechava e abria válvulas específicas para que meu mundo girasse ao redor dessa menina, para que me interessasse pelas coisas que essa menina se interessava, acreditasse nas coisas que ela acreditava e sentisse vontade de satisfazer os desejos que ela tinha.
sendo assim, o meu cérebro estava “configurado” para a Miss Bondade durante a narrativa do segundo capítulo da noite na pequena londres e é por esse motivo que a chamei de “epicentro”. adotei o linguajar da Miss Bondade, interpretei o curso dos fatos como a Miss Bondade gostaria que eu tivesse interpretado, o heartbreaker é um personagem que faz parte do universo imaginativo dela: “homens brincam com o coração das mulheres”, “homens fazem tudo errado, não sabem o que estão fazendo”, “Light Fuse And Get Away”. essa era a visão que ela tinha dos homens porque esse homem super-ansioso que brincava com o coração das meninas, cometia desastre atrás de desastre em seus relacionamentos e os terminava em dois meses, era seu irmão. com o meu cérebro chaveado para ela passei a ser influenciado por ela a ser parecido com ele, ao menos na minha imaginação, na minha “máscara”, através dos gostos dela.
você não deve ter se perguntado por que o capítulo dois da noite na pequena londres parou no momento em que a Olhos de Cristal, “um mulherão”, “me fisgou”. a resposta é que ela tirou o narrador do transe da Miss Bondade e então ficou impossível narrar a história porque ela deixou de fazer sentido, e aí veio o capítulo três com histórias que já não eram mais contínuas e sim uma análise mais profunda do que estava acontecendo internamente (a Misticismo e a Heartbreaker Prototype). e então, oh wow, quem liga para pequena londres? heart-shaped star apareceu! precisamos redesenhar o céu. e agora cá estou eu contando a história como ela deveria ter sido contada.
eu me ancorei na pior menina. na pior menina. não porque ela era ruim, a Miss Bondade não é ruim, mas ela era a pior menina possível pra mim.
tudo isso estava na minha cabeça. nada no coração. mais uma das coisas que era impossível para mim descobrir era que eu não acreditava no romance natural. essa minha habilidade de me adaptar a qualquer pessoa fazia eu acreditar que com qualquer pessoa daria certo, bastava eu ter a coragem, eu confundia “criar” com “despertar” desejos então acreditava que podia criar desejo por qualquer coisa para satisfazer outra pessoa, era só questão de querer. por eu ter bastante amor pelas pessoas no meu coração eu sempre topei desfrutar do que as pessoas gostavam ao invés de ficar exigindo que elas gostassem do que eu gostava, o que eu gostava era muito complicado para impor aos outros. só que isso era em nível de amizade, em nível de intimidade eu não sabia que não era tão fácil porque nunca tinha permitido ninguém chegar nesse nível. eu não gostava das mesmas coisas que a Miss Bondade, achava ridícula a maneira que ela investia o tempo livre e certas coisas dela eu nunca cogitei trazer para minha vida (os vídeos do youtube, a maneira que eu considerava supersticiosa e superficial de ver a fé embora fossem sim muito boas, só incompatíveis comigo. ou melhor AHHAHAHAHAHAHAHAHAHAHA EU SOU HEART-SHAPED STAAAAAAAAAAR LIBERDADE PARA SER UMA PESSOA HORRÍVEL LIBERDADE PARA SER UMA PESSOA HORRÍVEL AQUILO TUDO ERA RIDÍCULO MEU DEUS DO CÉU COMO “ENTRETENIMENTO GOSPEL” PARA JOVENS É INSUPORTÁVEL).
disclaimer de 2024: é vendo parágrafos como esse onde eu estava conseguindo me livrar desse inferno que percebo como valeu a pena escrever tudo isso, mesmo sabendo como tem coisas tão complicadas e erradas de se ler.
eu sempre me importei com ela, nunca me importei comigo. sempre me importei em ser a melhor pessoa do mundo para os outros e nunca me importei em permitir as outras pessoas a serem pessoas boas pra mim. se você acha isso nobre você tem treze anos de idade, isso é doentio, problemático e egoísta. é fácil ser a melhor pessoa do mundo para os outros quando você é um teatro humano impecável, que domina os desejos dos outros então sabe como mantê-los na ilusão de estarem sendo sempre apoiados e incentivados, sempre agradando; pobre do ser que acredita estar me agradando, eu sou um velho ranzinza ultra-crítico, eu nunca estou satisfeito. a minha dificuldade nunca foi “parecer” alguém para os outros, sempre foi “ser”, sempre foi deixar os outros entrarem na minha vida, virem até meu quarto e me ouvirem tocar as minhas músicas, assistirem os desenhos e séries que assisto, jogarem os jogos que jogo, ouvirem as músicas que eu realmente gosto, conhecerem os lugares para onde vou quando minha cabeça está muito cheia e provarem da minha maneira peculiar de ver o mundo. eu não me achava interessante e, graças a isso, fechava as portas para as pessoas que tinham interesse em mim. eu já chegava dizendo “me mostre quem você é!” e fazia de tudo para a pessoa nunca me perguntar quem eu era.
a Miss Maldade, até então, tinha entrado na minha intimidade melhor que a Miss Bondade, ainda que também de uma forma muito pouco satisfatória: nossos olhos e nossas expressões corporais estavam íntimos, mas em questão de “saber” eu sabia muito dela e ela sabia muito pouco de mim. ela tentou entrar em contato com as minhas novelas mas não conseguiu acompanhar porque não tinha todo esse hábito de leitura e, quando terminei a música da noite na pequena londres, mostrei-a e ela gostou mas não soube muito bem o que comentar.
foi aí que entrou de vez a Olhos de Cristal na jogada: assim que terminei a música fiz uma viagem a são paulo, nas férias do trabalho, e também viajei até o rio de janeiro. entre todos esses dias aconteceu o aniversário dela e fui desejar “feliz aniversário” no whatsapp, isso se tornou uma conversa sobre o rio de janeiro e… essa conversa não acabou, simplesmente não acabou. quase que simultaneamente parei de falar para sempre com a Miss Maldade. qual a impressão que você tem, ouvinte? sim, também teria essa: que “troquei de mina”. tenho certeza que eu julgaria alguém dessa forma se fosse hoje, mas não era isso.
conversar com ela era ótimo. sempre que ela tinha um tempo ela mandaria algo, eu também responderia sempre que desse. ela tinha uns assuntos que eu também gostava e alguns que não eram necessariamente algo que eu gostava mas eram conhecimento puro, era interessante. gosto de conhecimento puro. se alguém vem com coisas da faculdade pra mim, mesmo que seja de um curso de psicologia, farmácia, medicina, nutrição, sei lá, mesmo que seja um curso de cabeleireiro, eu fico interessado não porque quero agradar mas porque isso expande o meu universo imaginativo, é conteúdo saudável para eu montar personagens, idéias, e quem sabe pode ser útil em algum momento da minha vida, não é? e ela me contava as coisas da faculdade e do trabalho, eu perguntava as coisas da faculdade e do trabalho, ela perguntava as coisas do meu trabalho, eu contava as coisas do meu trabalho. trocamos também algumas coisas da intimidade, ficamos muito, mas muito, amigos.
até eu perceber que estava começando a sentir algo por ela.
isso foi horrível, percebi que fiquei mal por isso. ficar tanto tempo interessado na Miss Bondade me fez sentir desgosto em gostar das pessoas, ela tinha me rejeitado tantas vezes “indiretamente” (ou seja: na minha cabeça) que eu já comecei a criar monstros sobre essa menina, ao mesmo tempo em que não queria “abandonar o barco” porque não podia repetir os erros do passado e deixar de conversar com ela. e se fosse recíproco? e se eu partisse seu coração por falta de coragem? meu Deus! quanta coisa! quanto sentimento e quanta ansiedade, tudo ao mesmo tempo, criando um verdadeiro caos na minha vida! isso tudo em uma fase onde meu trabalho, um trabalho onde sempre havia turbulência, estava calmo demais, ao mesmo tempo em que eles estavam cortando tantos gastos que até o refeitório foi encerrado, então comecei a sentir que seria demitido. eu nunca tinha sido demitido mas dava pra “sentir” o clima, e por nunca ter sido demitido a ansiedade a respeito foi enorme.
no meio desse inferno mental todo eu a chamei pra sair e ela, “sem tempo”, não aceitou e achou horrível a minha inquietação, então acabou tirando de mim que eu estava gostando dela. ela disse que não era correspondido e blablabla e eu… fiquei aliviado jogando todo aquele peso no ar, tive a minha frustração, a minha decepção, mas tudo bem. permanecemos amigos, ficou tudo certo entre nós, embora eu tenha sido sincero e dito que seria melhor pararmos de conversar um pouco para não continuar nutrindo esse sentimento.
os monstros que eu tinha criado, no entanto, não ficaram “tudo bem”. foram muitos. estava com algo dentro de mim que não sabia o que era, não entendia, e não tinha muito a ver com uma mulher ou duas, tinha a ver com o fato de que finalmente em todos esses anos eu não estava prestando atenção em nenhuma mulher. ficamos eu, Deus e o meu pecado da perversão, então comecei a prestar atenção nesse meu pecado da perversão ao invés de só me entregar a ele para regular as engrenagens da minha maldade, comecei a prestar atenção no que gostava e tive o despertar para esse fato de gostar de coisas horríveis. pela primeira vez na minha vida eu consegui sentir nojo do que gostava ao invés de só saber que era nojento. a Olhos de Cristal era uma ótima menina, ela foi um doce de pessoa até me rejeitando e quando saímos novamente ela continuou sendo minha amiga e se importando comigo, ela simplesmente não era uma mulher má. eu… fiquei interessado numa pessoa boa e acessível pela primeira vez, eu quis algo bom pela primeira vez, e quando voltei para me banhar nas minhas coisas horríveis isso já não fazia mais sentido.
foi exatamente aí que ocorreu a “valsa da alma gritante”. foi aí que ela saiu de mim. foi aí que a moça dos cabelos longos e negros me disse “está chegando a sua hora”.