Série: mighty no. 9

7. All-Mighty Numbers

30 de junho de 2016

Eu amei os chefes.

Se me perguntarem se amo mais as fases, os chefes ou a trilha sonora desse jogo, não saberia responder. Vocês viram como elogiei as fases, e não perdem por esperar o prato de elogios que preparei para a trilha sonora. Os chefes estão pau-a-pau com eles no meu coração.

Sejamos bem claros: Mega Man não seria nada se, no final de cada fase, não houvesse um chefão esperando numa sala (na maior parte das vezes) fechada com seu terreno pronto e seus padrões. Era uma parte completamente necessária para o funcionamento do jogo. Os chefes ora sintetizavam o propósito da fase (Bubble Man, Mega Man 2), ora contrastavam os sentimentos provocados pela fase (Ice Man, Mega Man), e tinham acima de tudo a intenção de promover uma luta emocionante sem medo de acabar contigo para que você ficasse nervoso e jogasse o controle no chão se recusando a passar a fase inteira novamente.
Por um curto período (Mega Man X5 e X6), sem essa segunda parte de ficar nervoso.

Bem, Mighty No. 9 possui exatamente isso, e voltou com a intenção de deixar o jogador furioso. Olha, não tem um chefe que não seja criativo nesse jogo. Inclusive o final, que é terrível, mas vou explicar qual o problema dele em breve. Boa parte dos chefes são, de uma forma ou de outra, difíceis. Num sentido bem “Mega Man” de difícil, mesmo: dificinho se você dominou os padrões, assustador se ainda não entendeu o que está acontecendo na tela. E, alguns aceitem isso, outros não aceitem, com possibilidades de One-Hit K.O.

Claro que se assustar com isso é falta de jogar bem Mega Man: não preciso nem entrar em chefes obscuros como o Uranus, de Mega Man V de Game Boy; mas na série Zero recentemente redescobri que, caso esteja jogando realmente bem (ou seja, estiver no mínimo com um Rank A), o Harpuia e o Fefnir possuem ataques especiais que só não são OHKO se o jogador possuir acréscimo na barra de vida. Veja, funciona exatamente da mesma forma que os OHKOs desse jogo: o Pyrogen fica com as chamas azuis numa espécie de ataque especial, e o míssil do Battalion que mata instantaneamente é um ataque especial também.

Não tem um chefe que eu não me divirta jogando, de verdade, por conta de quão bem-feitos eles são. Uma vez briguei com alguém que tinha falado que a Cryosphere era uma merda e muito fácil, ainda nos tempos do beta, porque eu simplesmente sabia que o rapaz em questão não sabia do que estava falando. O beta da Cryosphere saiu há muito tempo para eu conseguir avaliar a dificuldade que senti na época, mas a criatividade daqueles padrões foi algo que me deixou deslumbrado naquela primeira experiência.

Ela é simplíssima, ainda mais depois de decorar que é importante mantê-la numa extremidade e derrubá-la rapidamente da plataforma, só prestando atenção nas bolas de gelo que quicam, batem na parede e voltam, mas… há toda uma questão de compreender o que raios ela está fazendo voando jogando água no chão, como desviar do congelamento inicial, ir errando e colocando-a nos lugares da tela com maior vantagem até descobrir que a extremidade é mais segura para Beck e como fazer ela parar numa extremidade. Talvez você nunca faça isso, já entendi que existem pessoas simplesmente incapazes, e também já entendi que vão ter os sabichões que vão falar “nossa, mas isso é muito fácil, só um burro pra não fazer dessa forma”.

Aí vão e ficam xingando o jogo dia e noite cada vez que são capturados pelo Pyro e explodem.
É assim que funciona Mega Man. E agora Mighty No. 9.

A Dynatron possui menos conteúdo para explicar, imagino. Ela é uma espécie de teste de paciência. Não só por ficar voando na tela e muitas vezes atingir alturas inalcançáveis para o Beck, mas principalmente pelos ataques onde arremessa os “dardos” que são eletrocutados depois. E não só pela possibilidade de atingi-lo com um deles, mas porque você precisa ficar limpando as paredes toda vez que não consegue condicioná-la a atirar apenas no chão. Mesmo que evitar ser atingido por um deles seja importante, porque também atrapalhará toda sua luta ter de ficar apertando botões aleatórios para se virar ao invés de continuar atirando.

Muitas vezes compensa mais tomar o dano e continuar atirando que ficar fazendo essas coisas complicadas. É mais um elemento-chave de qualquer luta de chefe, seja de Mega Man ou de Mighty No. 9. As pessoas acham que entendem bem os chefes ao derrotá-los com paciência, mas não é verdade, para compreender bem e dominá-los eles precisam ser jogados com a intenção de não tomar dano. Quer algo melhor? Chegue no chefe, qualquer um deles, sem vida nenhuma, podendo passar apenas caso não tome dano nenhum. Aí sim você vai descobrir suas habilidades ocultas e entender como desviar de qualquer ataque, montar a melhor estratégia para jamais ser encurralado, etc.
Ou vai simplesmente morrer e ficar muito nervoso.
Tudo bem.

De qualquer forma, nos jogos de navinha, isso se chama “modo de sobrevivência”. Mega Man clássico também compreendeu uma hora que isso era importante e, no sétimo jogo ou oitavo jogo, não vou me recordar agora porque não uso isso, criou um item que aumentava seu poder de fogo caso estivesse com pouca vida. Justamente para que você “sobreviva” por menos tempo.

O Seismic é um ótimo chefe. Um daqueles que sintetizam a fase perfeitamente. Ter de limpar a tela dos blocos que aparecem e usar grab-points para desviar de ataques com as brocas, os dois itens possíveis para conter elementos da própria fase, já que seria pura frustração sem propósito qualquer coisa com brocas que matam de imediato. É uma luta genuinamente simples, sem tática nenhuma, só atirar e desviar, então é das que entender o que cada ação dele significa e possuir reflexo e criatividade suficiente para desviar é tudo.

O Battalion também possui uma luta desse tipo, com o famoso adicional do míssil OHKO e sua explosão (aquela mata na hora também? Não sei, nunca fui atingido, nunca fui louco de ficar próximo daquele míssil grudado na parede). Gosto desse míssil, honestamente acho justo um disparo, que leva um tempão para ser efetuado, matar na hora um tapado que não percebe a gravidade do que está sendo feito ali. São padrões bem simples, puro combate, só para testar raciocínio a curto prazo e reflexo mesmo.

O Aviator possui uma luta bem única, se forçar bastante ela lembra um pouco (um pouquinho, bem forçado) os chefes aéreos da série X, mas creio que isso é mais por questão do formato do chefe e do seu território ser um objeto voador. Não é uma luta difícil, mas bastante tensa. Explicando: há esse objeto voador no centro, e mais duas plataformas voando, uma de cada lado da tela; há uma distância entre cada plataforma e o objeto, e mais espaço livre nas extremidades. Caiu, morreu.
Principalmente por conta do recuo de Beck ser grande, tomar qualquer dano é arriscado, você precisa ou se manter sempre no lugar certo direcionado para o lado certo ou dominar os reflexos pra conseguir voltar a um lugar seguro antes de cair. Entretanto, há outro problema: esse chefe causa dano, os ataques dele são bons, pode ser que fique tão preocupado em não cair que acabe perdendo toda a vida e morrendo (aconteceu comigo). É uma boa luta, um bom amontoado de sensações.

O Brandish é um chefe para a criançada: tenho um irmão de onze anos (costumo arredondar para dez) e ele está deslumbrado com esse. É o seu chefão “cool” padrão. Vermelho, espadinha, ninja, personalidade honrosa (“me mate por favor antes que eu perca totalmente o controle”), o que a criançada ama. Não sei se por coincidência, a luta tem um climão bem Slash Beast de Mega Man X4, em movimento num trem com um bichão fora de controle que sai cortando tudo.
Os padrões, no entanto, são completamente diferentes. O Brandish é o chefe perfeito para se treinar reflexos e até mesmo o dash agachado, considerando que, em seu ataque especial, ele vai cortando a tela e em algum momento específico o corte lhe obriga a fazer exatamente isso. De resto são golpes de curta distância, sendo ele bem rápido em te alcançar, corporais ou com a tesoura gigante (praticamente uma espada).

Temos, então, o Countershade, que é um daqueles chefes que mais é um minipuzzle que uma luta de fato. Para mim é de longe a mais fácil do jogo, sendo até uma recompensa porque sofri bastante em sua fase. O cenário é uma sala com sofá, lustre, e todos esses objetos fazem parte do cenário como plataformas. Ele mira em algum lugar da tela e manda tiros ricocheteantes, cuja trajetória fica exposta o tempo todo; você só precisa ficar fora do raio de alcance e isso às vezes é fácil e às vezes é um desafio. Mais pro final ele se utiliza de um clone para misturar duas trajetórias no cenário e te confundir, mas mesmo assim não faz muita diferença. O especial também é simples, só exige tempo correto. No final das contas é um chefe para você se posicionar corretamente na tela e atirar, como ele mesmo fez a fase toda e faz na própria luta. Torne-se um sniper melhor que o próprio Countershade. Fácil, mas divertido.

Temos o chefão da Call, que é provavelmente o mais simples e sem comentários do jogo todo. É como se fosse um chefão de Mega Man 1, 2, 9 ou 10, só que atirando lentamente, de verdade. Só atirar e desviar de padrões feitos para se atirar e desviar. O chefe da penúltima fase também é ótimo, bem criativo por sinal.

Por fim, vem o controverso e problemático chefe final, Trinity. A primeira impressão que tive foi: meu Senhor, que chefão feio. Sério, não acho o desenho dele feio, só que no jogo fica horrível já na primeira forma e nem mesmo sei o que comentar da segunda. Só que isso não é o pior. O pior é que ele é um chefe feito para Mega Man, não para Mighty No. 9.

Olha, quem disser que os padrões desse chefe são ruins está enganado, aliás, quem disser que a idéia desse chefe é ruim está enganado. Ele é melhor que muito Dr. Wily e até alguns Sigmas, e não estou dizendo porque acho que isso, por si, justifica a existência dele. Não tem nada de errado um chefe final não ter uma cartela de quinze padrões mirabolantes, já é um sacrifício ele ter duas formas, cada uma com seus três ou quatro padrões.

O que está errado é que ele é um chefe para se derrotar no Mega Buster carregado. Claro, não estou falando literalmente. Sei que você precisa usar o dash para atravessá-lo na segunda forma. O problema é que ele possui uma duração absurda por conta do tempo que ele fica invulnerável ou inalcançável. Os padrões te vencem pelo cansaço, chega um momento onde suas mãos ficam de saco cheio de repetir a mesma sequência de movimentos para desviar e mandar rajadas de tiros e você acaba tomando dano. E quando toma dano uma vez não para mais.

Consegue visualizar o problema? Não é que os padrões em si são ruins, é que eles serão, por norma, repetidos mais do que o necessário, porque é uma luta que simplesmente não avança. A primeira forma só tem um momento onde você consegue, de fato, parar e ficar atirando com fortes chances de desestabilizar o chefe, enquanto a segunda nem isso tem.

A solução? A arma do Battalion. Ela é praticamente um hack e faz com que você não se sinta Beck, mas Mega Man, porque a explosão causa dano no chefe de fato. Ele está no chão? Exploda-o, você o desestabilizará de uma a duas vezes. Ele está no ar? Deixe o míssil fincado, espere ele perder o escudo, exploda-o, e se der tempo repita. É como se você estivesse carregando seu Buster e atirando. Logo a primeira forma termina e você pode repetir isso na segunda que vai funcionar também.

Fica divertido assim, mas há a sensação de que está tudo errado. Está errado porque não é natural, parece que você está derrotando a Trinity de maneira completamente artificial, “hack”, jogando fora tudo o que o jogo ensinou até então para fazer um espetáculo de explosões.

Entendo que o jogo quer incentivar o jogador a usar outras armas, li no Reddit que alguns derrotam esse chefe com Brandish+Dynatron, eu tentei e achei muito abaixo do nível do Battalion. Pelo visto há essa vantagem de cada pessoa se equipar com o que acredita ser melhor e derrotá-lo da sua maneira, mas por que deixar o jogador descobrir isso da pior maneira possível? Se eu estiver errado me corrijam, mas conta aí pra mim, quem foi que pensou depois de morrer a primeira vez, “deve ser mais fácil usando tal arma”, se até então os chefes eram todos sensíveis ao Buster do Beck? Comecei a usar a do Battalion porque não suportava mais morrer pelo cansaço, fui tentando cada arma até chegar à conclusão de que essa era a melhor, mas foi muito game over até chegar nisso. Não é Mega Man X5 que você volta na porta do chefe, caramba, tem a fase final inteirinha antes para repetir — que bom que tiveram misericórdia e não colocaram revanche contra os chefes nessa fase porque eu seria a pessoa mais frustrada do mundo — , não dá pra ficar contando com o nosso intelecto dessa forma.

Acho que não dá para perceber isso assistindo vídeos. Assistindo dá a impressão de que está demorando porque o chefe não tem bons padrões, mesmo, mas jogando dá para perceber que o problema é outro. Gosto de todos os padrões da Trinity, mas tentar derrotá-la no Buster novamente nunca mais.

 

Você leu um capítulo da série mighty no. 9

escrito por nubobot42 narrado por leibniz