Existe, sim, um fato. É possível extrair inimagináveis conteúdos de um momento de silêncio. É impossível, no entanto, decidir o que se está extraindo.
Existem diversas definições de silêncio. Tento observar o que dizem. O silêncio pode incomodar, o silêncio pode confortar; pode gerar raiva, pode reafirmar amor.
Mas, a mim, o silêncio é um alerta.
Não há filosofia. Não há pensamentos. Não há reflexão. No meu silêncio, há sinais.
Existem formas mentais horríveis que tomam posse no silêncio; existem mordaças, e elas ocupam vozes. Vozes doces, trágicas, explosivas, vezes alegre, vezes triste; naturais. Algo que quer muito falar, mas está confinado. Sinais, algo está errado. O que está errado? O silêncio não me deixa saber. E quando eu resolvo desafiar o silêncio, me despeço de toda a passividade, declaro guerra e me preparo para encará-la com força; eu sou forte, juro, eu me esforço. Eu não tenho ajuda – isso não existe, conformo-me que nunca existirá, esse é o poder do silêncio.
E eu sei que tem algo de errado.
Sempre que ele está aqui, há algo de errado. Eu não posso ter mordaças. Minha mente almeja liberdade, o diálogo; minha mente almeja diálogos internos, a autocompreensão, consulta introspectiva, diagnósticos de visões que tive, mas não percebi. Preciso de completude, e ela não está no silêncio. O que há de errado? O silêncio permanece me impedindo de saber.
Mas não me entenda errado. Eu não te desejo.
Eu não desejo os outros. Não tenho senso coletivo – eu não quero que os outros me ouçam, eu não quero ouvir os outros; não em minhas guerras contra o silêncio. Eu não quero companheiros em minha guerra. Na verdade, eles me impedem de enxergar o inimigo; peso morto, vitamina para o maligno: é isso que são as pessoas no campo de batalha. As pessoas são sempre amigas do silêncio. Elas são o constrangimento. Aquilo que bloqueia em prol da timidez, ou mesmo do medo. Ao lado de alguém há uma reversão, uma tentativa desesperada de buscar o inimigo como anestésico – ao lado de alguém, buscamos tratado de paz, mas não se negocia paz com a instituição da tirania. E basicamente isso é tudo a se falar sobre o outro.
O inimigo é mais importante, interessante, fascinante. A maneira como as engrenagens emocionais param sem nenhum agente responsável identificável é o problema. Eu preciso de vozes, preciso das minhas vozes. Eu preciso que, quem as pegou, que devolva – você não vê? Ela está com medo, indefesa, tudo o que deseja é sussurrar em meus ouvidos os seus desejos. Ela precisa, e eu preciso dela. Devolva-me.
Aos outros, qualquer coisa, inclusive o silêncio. A mim, não há espaço para silêncio, e a paz não se realiza no silêncio – minha mente não é uma caldeira, minha mente é uma melodia dissociativa.
Eu declaro guerra, porque eu não sei o que está errado, e o silêncio não a deixa falar, e eu preciso saber.